Para resguardar a atmosfera terrestre, pessoas comuns e empresas incorporaram um cálculo simples, porém há muito esquecido: 1-1=0. Este é o raciocínio aplicado na neutralização do carbono, que tenta zerar a quantidade de gases do efeito estufa gerados nas atividades humanas, ou pelo menos chegar o mais perto possível do zero ideal. Para cada tonelada de carbono lançado na atmosfera, aplica-se um equivalente em projetos que retirem o gás da atmosfera ou que emitam muito menos do que normalmente.
A iniciativa começou alguns anos atrás em países ricos que trabalham sob políticas poluidoras mais restritivas e uma consciência ambiental afinada. No Brasil, ele deu seus primeiros passos em 2005, avançou timidamente em 2006 e promete surpresas no ano que se inicia, de forma consolidada e com projetos com o potencial de sacudir o mercado. Pequenas e grandes companhias nacionais estudam discretamente como incorporar a neutralização em suas práticas ambientais, com efeitos sentidos pelos clientes.
O carbono é um elemento presente na natureza, e na forma de gás carbônico (o CO2) é um dos componentes da atmosfera. Acontece que atividades humanas têm jogado CO2 demais no ar. Normalmente, a própria Terra se encarrega de absorver esse gás da atmosfera, num delicado e equilibrado ciclo. Porém, desde a Revolução Industrial, no século 18, é produzido muito mais do que a natureza é capaz de lidar.
Esse carbono excedente pode ser neutralizado. Projetos florestais, com o plantio de árvores, são um dos caminhos usados, pois absorvem o CO2 que está no ar e o estocam como biomassa. Aquelas quatro toneladas emitidas por você no ano, por exemplo, equivalem de 6 a 7 árvores. "Aquele ditado 'tenha um filho, escreva um livro e plante uma árvore antes de morrer' está errado. Para compensar sua vivência, você precisa plantar mais de 300 árvores", diz o ambientalista Mario Mantovani, da ONG SOS Mata Atlântica.
Companhias de grande porte emitem milhares de toneladas de carbono por ano. "Toda empresa, de maneira direta ou indireta, gera gases do efeito estufa", afirma Fernando Giachini Lopes, da Key Associados, uma das consultorias brasileiras que calculam a emissão das operações cotidianas de uma empresa.
A quantidade varia de acordo com o setor em que atua (as maiores são siderurgia, por causa dos fornos, e transportes, devido ao combustível queimado). As metodologias empregadas neste cálculo variam, mas todas levam em conta três fontes: as diretas, como a utilização de combustíveis fósseis; as indiretas, como o consumo de energia elétrica; e as relacionadas - basicamente o que é produzido por fornecedores.
Aposta
Empresas, dos mais diferentes setores, começam a engrossar a fila dos projetos de neutralização de carbono no Brasil. São três aspectos que levam companhias a investir neste campo. Além da responsabilidade socioambiental, parte de sua reputação, a neutralização de carbono é uma oportunidade de se destacar no mercado em ações de marketing.
O último motivo é de fato uma aposta, a ser colhida em médio e longo prazos. Para o setor produtivo, a crise ambiental que se aproxima pelo agravamento do efeito estufa forçará o Brasil a assumir metas de redução de sua emissão de gases, no molde que os países ricos seguem atualmente. Paradoxalmente, o tema é ainda tratado como sensível dentro das esferas governamentais, porém já foi totalmente incorporado pelas empresas brasileiras. "Mesmo que os países pobres não tenham metas, haverá barreiras tarifárias ou técnicas nas outras nações", diz Lopes. "Por isso, quem tem visão de futuro investe em redução e neutralização de emissões."
Números
- 320 quilos de CO2 são emitidos na atmosfera na geração de 100 kW para alimentar uma casa em um mês, valor neutralizado com uma árvore
- 548 quilos de CO2 são emitidos em uma viagem aérea entre São Paulo e Brasília, ida e volta - sem contar o trajeto de carro até o aeroporto
- 3 toneladas de CO2 podem ser neutralizadas pelo plantio de 5 árvores em média, pois a quantidade de carbono absorvido varia segundo a espécie.
- R$ 10 é quanto custa em média uma árvore usada no reflorestamento da mata atlântica, dentro de projetos florestais preexistentes.
- 6 árvores são suficientes para compensar o que um carro a gasolina lança no ar em um ano.
- 100 árvores plantadas numa área de mata ciliar vão compensar o show de lançamento da nova turnê da banda Jeito Moleque.
- 60.000 árvores formam a primeira floresta da Volkswagen Caminhões no sul fluminense, plantada em 2006.
- 220.000 toneladas de gases do efeito estufa deixarão de ser emitidos em dez anos com o apoio da Fifa, que investe num projeto na África do Sul para zerar o que foi emitido na Copa de 2006.
Redução exige estratégia própria para cada gás
O gás carbônico (CO2) é apenas um dos gases do efeito estufa cujas emissões precisam ser reduzidas, dentro das convenções internacionais, para evitar o aquecimento global em níveis perigosos. O metano, seis vezes mais potente do que o CO2, é o segundo principal causador do problema. Para facilitar o cálculo de quanto é emitido, todos são transformados em carbono equivalente, de acordo com seu papel no agravamento do efeito estufa. Porém, quem trabalha com metas de redução lida com cada um separadamente, pois exigem soluções diferentes. O metano, por exemplo, é gerado na decomposição do lixo orgânico.
Fonte: O Estado de S. Paulo, com base em matéria de Cristina Amorim
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