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Geoengenharia: possibilidades e riscos de uma gestão tecnológica do clima

Trajetória do aquecimento global impulsiona debate sobre tecnologias para redução de incidência solar e captura de carbono em escala planetária

Flavio Lobo

A complexidade do sistema climático do planeta implica duvidosa previsibilidade em relação a efeitos de manipulações tecnológicas em larga escala.

Diante dessa constatação, muitos especialistas consideram tentativas de impedir ou mitigar significativamente o aquecimento global por tecnologias para alteração climática – o que se convencionou chamar de “geoengenharia” – algo arriscado demais para ser efetivamente cogitado. Outros argumentam que, diante do potencial catastrófico da atual trajetória das mudanças climáticas, essa possibilidade não deve ser descartada. O mais sensato, hoje, de acordo com essa segunda visão, é ampliar e acelerar as pesquisas nessa área, de modo a permitir avaliações cada vez mais seguras de viabilidade, potenciais e riscos de diferentes tecnologias.

Recente reportagem da Politico – revista online sediada nos EUA – faz um bom mapeamento desse tema tão contemporâneo, apresentando e esclarecendo, conceitos, tecnologias, evidências e posições no debate.

Como aponta o mais recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), divulgado em agosto, dada a inaptidão dos sistemas políticos e econômicos para operar mudanças suficientemente rápidas e profundas, o limite relativamente seguro de elevação média de 1,5 grau Celsius da temperatura do planeta deverá ser ultrapassado nas próximas duas décadas, rumo a elevações médias significativamente maiores.

As alternativas tecnológicas para tentar conter essa escalada da temperatura média e seus efeitos são de dois tipos: formas de redução de incidência de radiação solar na superfície terrestre e modos de remover carbono da atmosfera.

Tipos e efeitos de tecnologias climáticas

Entre as tecnologias de captura de carbono, destacam-se o plantio de árvores e o manejo dos solos de acordo com parâmetros cientificamente apurados, em escala gigantesca, e alterações químicas no oceano favoráveis à proliferação de certos microrganismos. Opções para atenuar o aquecimento solar incluem a produção de “nuvens brilhantes”, capazes refletir parte da radiação que hoje atinge e aquece o planeta, e a injeção, na atmosfera, de partículas que reduziriam a difusão de luz.

O tema e o dilema a ele associado já habitam a consciência coletiva. Algo que se percebe em diversas obras de ficção que apresentam cenários futuros tanto de salvação tecnológica do lar terrestre da humanidade, quanto de eventos apocalípticos causados por prepotência associada a visões de mundo tecnicistas.

Pouco depois da publicação das matérias da Politico, a revista científica Nature publicou notícia sobre uma iniciativa pioneira para produção de “nuvens brilhantes” (brightening clouds). Com objetivo de preservar a Grande Barreira de Coral, no mar da Austrália, ecossistema que vem sofrendo acelerada degradação devido ao aquecimento, uma máquina de vaporização de água do mar nutriu as nuvens da região com gotículas de salmoura, dotando-as de maior poder de reflexão solar.

O grupo responsável pelo experimento australiano, feito em pequena escala, anuncia que os resultados iniciais indicam um potencial de impacto, em termos de redução da temperatura oceânica, maior que o inicialmente previsto. Outros pesquisadores criticaram a iniciativa apontando escassa fundamentação científica da sua formulação e ausência de consultas e diálogo em âmbito acadêmico e de órgãos internacionais capazes de prover parâmetros regulatórios para esse tipo de projeto.

Alertas importantes

Como alerta para esse tipo de controvérsia, a Politico informa que, entre diferentes modelagens computacionais de previsão de impacto da produção de nuvens refletoras em larga escala, há uma que prevê, entre os danos colaterais, a extinção da Floresta Amazônica.

Nessa discussão, outro risco, mais genérico, não deve ser minimizado: o desincentivo a medidas seguras de redução de emissões de carbono e mitigação de efeitos das mudanças climáticas movido a promessas de soluções tecnológicas incertas e arriscadas.

Acesse a principal reportagem da Politico sobre o tema – “O problema de brincar de Deus para consertar o clima: pode não funcionar” –, clicando aqui.

Para acessar matéria complementar da Politico – “Os perigos da formulação de regras para manipulação climática” –, clique aqui.

A notícia da Nature – Nuvens artificialmente alteradas podem salvar a Grande Barreira de Coral? – está disponível por este link.