Inovação - Do laboratório à linha de produção |
2007 . Ano 4 . Edição 34 - 10/5/2007 Para incrementar o crescimento econômico e o bem-estar da população, é preciso formular projetos consistentes de pesquisa, investir na investigação, aguardar resultados e aplicá-los no setor produtivo. O esforço vem sendo feito por governos, empresas e instituições científicas e tecnológicas
O Brasil está entre os oito países que mais investem em P&D, no The Economist Intelligent United Survey, mas é o 53º no ranking de competitividade tecnológica do Fórum Econômico Mundial Globalização, abertura de mercados e acirramento da competitividade internacional representam grandes desafios para governos e empresas.Os que não oferecem produtos diferenciados, de boa qualidade, a baixo custo, não encontram mercado. Isso significa que o fluxo de caixa diminui, criam-se menos empregos e toda a economia fica prejudicada. Para participar da roda econômica internacional, tornou- se necessário, em tempos recentes, promover investimento pesado em pesquisa e desenvolvimento - não em investigações teóricas apenas, mas naquelas que possam ser implantadas em parques industriais, com resultados mensuráveis. O Brasil apresenta indicadores contraditórios nessa seara. Segundo uma pesquisa elaborada pelo The Economist Intelligent United Survey,braço do grupo britânico que publica a revista The Economist, hoje o país está entre os oito que mais investem em pesquisa e desenvolvimento (P&D).Também figura entre os seis mais citados como alvo de investimentos por multinacionais.Entretanto,no ranking de competitividade tecnológica do Fórum Econômico Mundial, o país ocupa a 53ª posição entre 122 países.O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) identificou cerca de 1,2 mil indústrias inovadoras, dado que preocupa a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), cuja meta é chegar a 2010 com 4 mil empresas nessa categoria."Dispomos de competência empresarial, criatividade e qualificação técnica e científica. Precisamos articular um projeto de desenvolvimento, com cooperação pública e privada, no qual a inovação seja ingrediente essencial para alavancar a produtividade", diz Rodrigo da Rocha Loures, vice-presidente da CNI . No II Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria, realizado no final de abril em São Paulo, representantes do governo e da iniciativa privada mostraram-se dispostos a estimular a inovação.O momento, portanto, parece ser propício a uma maior movimentação."Nosso crescimento não é ruim,mas precisamos correr muito para não perder posição, e mais ainda se quisermos abrir novos espaços", diz Evandro Mirra, diretor de inovação da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).Poucos dias antes, em 19 de abril, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto que concede isenções tributárias a fabricantes de dispositivos eletrônicos, semicondutores, displays e equipamentos transmissores de sinais da televisão digital que invistam em projetos de P&D aprovados pelo governo. Se for mantido pelo Senado, empresas inovadoras terão redução de 50% do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre máquinas, equipamentos e outros bens destinados à pesquisa; e poderão deduzir suas despesas nessa área da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Laboratório de pesquisa de Biologia na Universidade de São Paulo: centro de excelência em investigação e formação de cientistas A preocupação é recente. Até pouco tempo atrás, trabalhos desenvolvidos por pesquisadores que poderiam ser aproveitados em linhas de produção permaneciam engavetados. O álcool combustível, da década de 1930, apenas muitos anos depois atingiu escala de mercado. A lembrança é de Leonard Sebio, pesquisador do Centro de Pesquisa em Tecnologia de Extrusão da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), de São Paulo. Ele desenvolveu um plástico biodegradável à base de amido de milho e gelatina, e batalha para sensibilizar o mercado, aperfeiçoar e disseminar sua inovação."Não podemos desanimar.Temos de acreditar na importância de nossos projetos", diz. A questão é especialmente interessante pelo fato de o Brasil ser reconhecido internacionalmente por sua produção científica. Conforme dados contidos no cadastro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), em 2004 havia 335 instituições de pesquisa, 77,6 mil pesquisadores e 47,9 mil doutores no país.Mais. Segundo levantamento feito pelo Instituto para a Informação Científica (ISI), em 2005 o Brasil registrava 15,7 mil artigos científicos publicados - 1,8% da produção mundial -,desempenho que lhe garantia o 17º posto no ranking internacional."Mesmo com essa produção significativa, pouco é utilizado para incrementar a produtividade da indústria", constata Ennio Candotti, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
O país conta com 335 instituições de pesquisa, 77,6 mil pesquisadores e 47,9 mil doutores, que publicaram 15,7 mil artigos científ icos em 2005 - 1,8% da produção mundial
A Embrapa é líder em inovação na área do agronegócio, motor do crescimento econômico do paíscientistas Financiamento No meio científico,não falta quem critique a escassez de recursos para o trabalho e o atendimento às demandas do setor produtivo.Ocorre que as verbas dos Fundos Setoriais,maior fonte de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) destinado a instituições sem fins lucrativos, estão contingenciadas.Para João Alberto De Negri,diretor do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o corte de recursos representa um erro no processo de gestão dos Fundos Setoriais."É necessário reverter às pesquisas 8 bilhões de reais nos próximos oito anos para que o Brasil chegue a um patamar intermediário entre os países em desenvolvimento", diz. E vai além."Hoje,a única instituição federal que apóia de fato a atividade criativa no país é a Finep.Mas,das 80 mil empresas existentes, somente 50 recebem financiamentos da instituição ao ano."Segundo o presidente da SBPC, o contingenciamento chega a 40%. Com isso, deixam de ser formados profissionais habilitados e há a limitação ao desenvolvimento de pesquisas."O maior exemplo dessa carência está na escassez de pesquisas e profissionais na área de engenharia, e de estudos da biodiversidade na região amazônica,que precisa de cerca de 10 mil pesquisadores e tem cerca de 1,5 mil", afirma Candotti. Recentemente, o ministro de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, anunciou a criação de um fundo de 40 milhões de reais para fomentar as investigações na região. Em vigor desde 2000, os Fundos Setoriais foram criados para dar suporte a projetos de pesquisa e desenvolvimento e inovação. Suas receitas são provenientes das contribuições sobre o resultado da exploração de recursos naturais pertencentes à União, além de parcelas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de alguns setores e da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide).Contemplam dezesseis modalidades de investigação,da área aeroespacial à integração universidadeempresa. Mas destinam-se,principalmente, a segmentos da Política Industrial,Tecnológica e de Comércio Exterior (Pitce),que tem como principais eixos os biocombustíveis, os fármacos e medicamentos,software e semicondutores e TV Digital; além do reaparelhamento da infra-estrutura de universidades e institutos de pesquisa. A maior empresa pública de fomento é a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), subordinada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).Outra ferramenta importante é o CNPq,que também compõe a estrutura do MCT.Ambas as organizações têm enfrentado pressão crescente devido ao aumento da demanda por produção científica e inovação tecnológica aplicadas (ou aplicáveis) no setor produtivo, especialmente industrial. Para atender às expectativas, a Finep já abriu novas linhas de financiamento ao empresariado,com recursos da Subvenção Econômica à Inovação em Empresas.A iniciativa é um dos primeiros efeitos da Lei da Inovação nº 10.973, de 2004.Trata-se da concessão de quantias não reembolsáveis para empreendimentos inovadores. Há, ainda, na instituição,programas que oferecem crédito a empresas sem cobrança de juros, e uma carteira especial para empresas de pequeno porte,montada em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae).Além disso,existe o Programa de Apoio à Pesquisa em Empresas - Pappe Subvenção -,lançado em 2006, que financia projetos de P&D em micro e pequenas empresas em áreas consideradas prioritárias pela indústria. É realizado em parceria com as fundações estaduais de amparo à pesquisa e seus recursos são aplicados diretamente nas empresas."Cabe aos atores do sistema nacional de C&T, incluindo ministérios, agências, universidades e empresas, cumprir o papel de formular bons projetos e aplicar corretamente os recursos, para que sejam investidos em quantidade e com qualidade", diz Rogério de Medeiros, responsável pela área de planejamento da Finep. Investir em ciência e tecnologia é fundamental para o desenvolvimento
Unicamp: parcerias com empresas para a descoberta de novidades capazes de gerar riquezas Na região Nordeste,o destaque é a Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Facepe).A maior parte de seu orçamento é destinada a projetos de pesquisadores vinculados à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE),que conta com o maior número de doutores e bolsistas do CNPq.O desempenho está longe do esperado, conforme constata Alfredo Arnóbio da Gama,diretor de Ciência,Tecnologia e Inovação da instituição. Segundo ele,há grande desconhecimento acerca das regras de financiamento de pesquisas por parte do setor empresarial."Em Pernambuco, a exceção é o segmento de software,área nova e pouco dependente de uma infra-estrutura pesada e dispendiosa", analisa. Bom exemplo, nesse ponto, é o Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (C.E.S.A.R), criado na UFPE e depois deslocado para o Porto Digital - um pólo de tecnologia. Fomenta parcerias e forma mão-de-obra especializada.Hoje, mantém parceria com empresas como Microsoft e IBM, trabalha em cooperação com centros tecnológicos, como o Instituto Eldorado,e tem convênios com pólos de pesquisa de outras regiões,como a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Um de seus frutos é o centro de testes de software, um dos vencedores do Prêmio Finep de Inovação Tecnológica de 2006. Resumo dessa ópera: para que o Brasil não perca espaço no ambiente globalizado em que vivemos,são necessários mais projetos, recursos, integração entre as diversas esferas interessadas nos resultados provenientes de pesquisa e desenvolvimento."O que precisa melhorar é a consolidação da percepção de que investir em ciência e tecnologia é fundamental para o crescimento do país.Nesse sentido,tanto o governo como a iniciativa privada precisam definir estratégias de desenvolvimento sustentável", sintetiza Daniel Pereira, pró-reitor de Pesquisa da Unicamp.A Lei de Inovação, segundo ele, é um bom exemplo.Reformas tributárias e políticas econômicas que privilegiem o desenvolvimento são outros instrumentos indispensáveis,em sua opinião. "O estabelecimento da interface entre o setor produtivo e o acadêmico é oportuna e essencial", diz Gabriel Mário Rodrigues, presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior. A Unicamp, ao lado da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), ocupa a linha de frente entre empresas e instituições que depositam pedidos de registro de patente no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI)."Esse é um indicador da fragilidade da competitividade do setor produtivo nacional.O processo de inovação tecnológica é responsabilidade do setor produtivo", analisa Pereira, pró-reitor da universidade.A Embrapa, por seu turno, é referência em pesquisa no setor de agronegócios no planeta.Mantém mil investigações em 38 unidades. Parece ótimo,mas é preciso mais.Segundo seu diretor executivo, José Geraldo Eugênio, nos últimos anos houve recuperação gradual,mas ainda insuficiente, do apoio à ciência e à tecnologia voltadas para o agronegócio."Um terço da economia nacional vem do agronegócio.Por isso,temos de ter um sistema de pesquisas fortalecido com boas empresas estaduais, universidades e cursos de pós-graduação funcionando. É nesse ponto que devemos reforçar os orçamentos", diz. Ou seja,muita coisa vem acontecendo, mas é preciso maior movimento para que o país não perca competitividade,a economia cresça de forma sustentada e haja melhora real na qualidade de vida dos brasileiros. Saiba mais: Financiadora de Estudos e Projetos Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Ministério da Ciência e Tecnologia |