2010 . Ano 7 . Edição 58 - 26/02/2010
OIT aponta avanços e desafios
Mesmo com o aumento da formalidade, metade dos trabalhadores brasileiros não tem carteira assinada nem direito ao sistema de seguridade social
O Brasil registrou importantes avanços na promoção do trabalho decente entre 1992 e 2007: o nível de ocupação voltou a crescer, a participação das mulheres no mercado de trabalho aumentou, o desemprego caiu a partir de 2003, aumentou a formalidade dos trabalhadores, os rendimentos expandiram-se e contribuíram para reduzir a pobreza, a desigualdade e as condições de vida da população. Mas ainda há grandes desafios, como a erradicação do trabalho infantil e o desemprego entre os jovens, constata o documento Perfil do Trabalho Decente no Brasil, divulgado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). O estudo faz parte de um teste-piloto que a instituição está fazendo no Brasil, Áustria, Malásia, Tanzânia e Ucrânia para medir 10 indicadores do trabalho decente - oportunidades de emprego; rendimento adequado; jornada de trabalho; trabalho, vida pessoal e familiar; trabalho a ser abolido; estabilidade e segurança no trabalho; igualdade e oportunidades; ambiente de trabalho seguro; seguridade social; e sindicalização.
No caso brasileiro, segundo a OIT, houve avanços na erradicação do trabalho infantil, mas "o número de crianças trabalhando ainda é elevado". Outra preocupação é o desemprego entre os jovens: "O desemprego juvenil continua em níveis bastante elevados (sendo mais do que o dobro em comparação com os adultos), além de ser inquietante a proporção de jovens que não estudam nem trabalham". A instituição ressalta que o estudo tem como base dados Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2007, portanto não reflete a piora das condições do mercado de trabalho devido à crise econômica internacional. Mas registra que a situação voltou a melhorar no final de 2009.
Dos 7,8 milhões de desempregados em 2007, 3,6 milhões, ou 46,7% do total, tinham entre 15 e 24 anos de idade. Já a população que não estudava nem trabalhava chegava a 6,4 milhões naquele ano. O problema atinge mais as mulheres do que os homens, principalmente por causa dos trabalhos domésticos ou da gravidez precoce. Mesmo assim, a participação das mulheres no mercado de trabalho tem crescido.
O estudo destaca ainda que somente metade dos trabalhadores brasileiros está no mercado formal, com direito aos benefícios sociais, e recomenda a adoção de políticas públicas de promoção do trabalho decente, porque o País terá 65 milhões de idosos em 2050. Segundo José Ribeiro, pesquisador da OIT, a tendência é de crescimento da população idosa em maior proporção do que a de jovens em idade ativa.
Embora tenha se reduzido, a jornada de trabalho para grande parte dos trabalhadores brasileiros continua acima do permitido pela legislação: 35,5% trabalham mais 44 horas semanais e 20,3% mais de 48 horas. "A carga excessiva de trabalho afeta mais os homens do que as mulheres", afirma. Mas o cálculo não inclui o trabalho doméstico: "A massiva incorporação das mulheres ao mercado de trabalho não vem sendo acompanhada de um satisfatório processo de redefinição das relações de gênero". Se consideradas as tarefas domésticas, a jornada de trabalho feminina sobe para 57 horas semanais, cinco horas a mais do que a masculina.
Além de ter maior carga horária de trabalho, as mulheres e os negros têm os menores salários no mercado de trabalho. A OIT registra que de 2004 a 2007 o rendimento médio do trabalho subiu 15%, para R$ 931,00. Mas a renda média dos homens era de R$ 1.059,00 enquanto a das mulheres era de R$ 745,00. Ou seja, o rendimento das mulheres correspondia a 70,3% do recebido pelos homens, embora a desigualdade tenha reduzido em comparação com 1992, quando o percentual era 61,5%. "As desigualdades de rendimentos entre os trabalhadores negros e brancos é ainda maior: em setembro de 2007 os brancos recebiam, em média R$ 1.184,00 e os negros R$ 653,00, ou seja, apenas pouco mais da metade (55,2%) dos primeiros." Em 1992 era 50,3%.
O rendimento médio do trabalhador brasileiro aumentou com o Plano Real, em 1994, atingindo o maior valor em 1997. A partir daí, entrou numa trajetória de queda, só revertida em 2004, com os aumentos do salário mínimo e a retomada do crescimento econômico. A recuperação foi interrompida em 2008 por causa da crise internacional, mas retomou o crescimento no ano passado.
Mulheres e negros também permanecem menos tempo no mesmo emprego, o que evidencia "maior fragilidade do vínculo empregatício". Em média, os trabalhadores ficam oito anos no emprego, mas uma boa parte - 18,2% - ficam menos de um ano. "A estabilidade no trabalho é importante pra desenvolver o capital humano e está vinculada com aumentos na produtividade", afirma o documento. Para contrabalançar a rotatividade no emprego, o seguro desemprego é importante e assegura renda aos trabalhadores em épocas de desemprego. Entretanto, só os trabalhadores formais têm direito ao benefício e mesmo assim há exigências que dificultam o acesso.
A OIT reconhece, entretanto, melhora nos indicadores do trabalho decente no Brasil, proporcionadas pelo crescimento econômica dos últimos anos, apesar dos juros altos: "O período abrangido por este relatório foi marcado por uma política monetária cujo objetivo principal é o controle da inflação. Analisando-se os dados da inflação para o período, é evidente que a política funcionou, mas com um custo elevado, já que foi promovida por taxas de juros extremamente altas, que afetaram negativamente os níveis de investimento no País".
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