2010 . Ano 7 . Edição 61 - 13/08/2010
Brasil cria Política Nacional de Mudanças Climáticas e assume metas quantitativas de redução de emissão de gases de efeito estufa
Cora Dias - de Brasília
É cada vez maior a responsabilidade de países em desenvolvimento, como Índia e China, na redução de gases de efeito estufa (GEE). Embora não façam parte dos países que têm metas obrigatórias de mitigar o aquecimento global, se esses países mantiverem seus níveis de crescimento econômicos atuais, sua contribuição para a mudança climática, em termos de quantidade de GEE acumulados na atmosfera, será equivalente à dos países desenvolvidos em poucos anos. O Brasil assumiu essa responsabilidade, ao aprovar a Lei 12.187/2009, que trata da Política Nacional sobre Mudança do Clima.
O princípio estabelecido pela Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCC, na sigla em inglês), "responsabilidade comum, porém diferenciada", reflete o reconhecimento de que a preocupação com o aquecimento global é de todos, mesmo que em proporções diferentes. "Para termos consequências menos drásticas no futuro, o esforço não pode ser apenas dos países desenvolvidos. A mitigação por parte dos países em desenvolvimento é urgente, e não deve ser feita apenas por Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (instrumento de flexibilização, previsto no Protocolo de Quioto, no qual países desenvolvidos podem comprar créditos de carbono a partir de projetos de redução de emissão em outros países)", afirmou Thaís Juvenal, diretora do Serviço Florestal Brasileiro do Ministério do Meio Ambiente (MMA), durante o seminário "As Negociações Internacionais e as Ações Brasileiras", promovido pelo Ipea, no final de abril.
Para que as emissões de GEE em países em desenvolvimento não sigam o padrão histórico de emissões dos países desenvolvidos, discute-se, no âmbito da UNFCC, a regulamentação de Ações Nacionalmente Apropriadas de Mitigação (Namas, na sigla em inglês) e do mecanismo de Redução de emissões por desmatamento e degradação florestal (REDD). Com as Namas, os países da Convenção podem estabelecer ações que visem à redução de emissões e a forma como essas ações podem ser mensuradas, reportadas e verificadas. As ações e metas das Namas serão realizadas de forma voluntária, sem que haja uma obrigatoriedade prévia de realizá-las.
Por possuir uma matriz energética diferenciada, com alta produção de eletricidade por hidrelétricas e grande produção de biocombustíveis, o Brasil apresenta um perfil de emissões diferente do encontrado nos países desenvolvidos, em que a queima de combustíveis fósseis representam a maior parte das emissões.
Atualmente, o país contribui para a redução do aquecimento global por meio do mercado de carbono e da implantação de projetos de MDL. Segundo José Miguez, coordenador geral de Mudanças Globais do Clima do Ministério de Ciência e Tecnologia, que também falou sobre o tema durante o seminário, realizado pelo Ipea, o Brasil é responsável por 7% dos projetos de MDL existentes hoje no mundo. "O país possui 445 projetos, que equivalem a 380 milhões de toneladas de créditos de carbono, o que rende ao país 480 milhões de euros por ano", afirmou Miguez. Para o técnico do Ipea, Gustavo Luedemann, o MDL é uma grande oportunidade para o país e as empresas brasileiras devem ser incentivadas a implantar projetos desse mecanismo. "Os projetos brasileiros de MDL já possuem muita credibilidade junto à ONU (Organização das Nações Unidas). Essa é uma oportunidade para o país modernizar seu parque industrial", explicou Luedemann. De acordo com o técnico em planejamento e pesquisa do Ipea, Ronaldo Seroa da Motta, o sucesso da Política Nacional sobre Mudanças Climáticas e do mercado de carbono brasileiro dependerão da articulação entre os planos setoriais e a gestão dos incentivos econômicos que vão exigir uma estrutura de governança transparente, tecnicamente ágil e autônoma. Seroa propõe, inclusive, a criação de uma agência reguladora, com uma estrutura de autarquia autônoma, como é o caso da Anatel e Aneel, que regulam, respectivamente, os setores de telecomunicações e energia do país. "Com corpo técnico capacitado e transparência nas decisões, a agência terá maior liberdade para tomadas de decisões, independente da mudança de governos", explica Seroa.
O Comunicado do Ipea número 45, "Perspectivas sobre as negociações de mudança climáticas e seus impactos na política brasileira", lançado também em abril, mostra que é menos oneroso para o país reduzir as emissões em suas atividades emissoras, em especial o desmatamento, do que naquelas em que já há eficiência. O documento destaca que ações nacionais concentradas no controle do desmatamento podem oferecer ao país uma significativa vantagem comparativa, pois a redução do desmatamento é, sem dúvida, menos restritiva ao crescimento econômico do que restrições ao consumo de energia e a processos industriais, as quais alguns países emergentes temem adotar neste momento.
Segundo Thaís Juvenal, a partir da Conferência de Copenhague, Dinamarca, realizada em dezembro 2009, o Brasil estabeleceu cinco segmentos em que atuará para diminuir a emissão de GEE: redução do desmatamento da Amazônia e também do Cerrado; investimento em energia limpa, como os biocombustíveis; substituição da produção de carvão original de desmatamento por carvão de florestas plantadas, e a utilização do plantio indireto na agricultura. Com isso, espera-se que o país reduza entre 36,1% e 38,9% da sua emissão de gases de efeito estufa até 2020 (ver tabela).
Para que esses setores atinjam as metas estabelecidas pela Política Nacional de Mudança Climática, o governo criará o Fundo Clima, que terá o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como agente financeiro e o MMA, como coordenador. "Para este ano, não há previsão para ações de financiamento, ainda é preciso estruturar o Fundo Clima", explicou Thaís.
Durante os meses de maio e junho, haverá discussões entre governo e atores de interesse, inclusive do setor privado, para refletir sobre marco regulatório e instrumentos de mitigação. Em novembro de 2010 deve ser lançado um inventário das emissões de GEE do Brasil, com dados atualizados.
COPENHAGUE A 13ª Conferência das Partes da UNFCC, conhecida como COP-13 e realizada em dezembro de 2007, em Bali, na Indonésia, teria o mandato para estabelecer as metas dos países industrializados no período pós-2012, ano de término do Protocolo de Quioto.
Segundo o Comunicado do Ipea n° 45, a conferência teve dificuldades para encontrar consensos em vários temas e a saída política encontrada foi a assinatura de um documento que estabelecia o "Mapa do Caminho de Bali", com a definição dos temas que teriam de ser discutidos e para os quais teria que haver um consenso até a COP-15, em Copenhague.
Em Bali, foram estabelecidas as propostas de criação das Namas e do mecanismo de REDD. A COP-15 tinha a previsão de marcar a conclusão de um processo de negociação de dois anos que se seguiu a Bali. No entanto, não foi possível alcançar um acordo legalmente vinculante de expressão na Conferência de Conpenhague.
A solução veio informalmente: chefes de estado e ministros de cerca de 30 países, entre os quais as maiores economias do mundo, líderes dos principais blocos negociadores e o Brasil, se reuniram durante o "segmento de alto nível" da Conferência e elaboraram um difícil acordo político que ficou conhecido como o Acordo de Copenhague. O texto propõe que os países que o assinam reconheçam a necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa para estabilizar o clima, com um aumento de temperatura de 2° C neste século. Além disso, o acordo afirma que as nações ricas se comprometem a direcionar US$ 30 bilhões nos próximos três anos para ajudar nações pobres a lidar com as alterações climáticas.
Embora tenha sido aceito oficialmente pela ONU, o acordo não teve aprovação unânime. Países como a ilha de Tuvalu, que fica na Polinésia, por exemplo, foi contra o acordo por acreditar que, se o clima aumentar em 2° C até o final do século, a ilha não existirá mais. Além de Tuvalu, Bolívia, Venezuela, Cuba, Costa Rica e Nicarágua também criticaram o acordo.
O CAMINHO DE BALI A ONU nomeou, em maio, a diplomata costarriquenha Christiana Figueres, para dirigir o Secretariado de Mudança Climática da entidade, e promover avanços nas conversas internacionais para conter as emissões de GEE do mundo.
Figueres, de 53 anos, substituirá o holandês Yvo de Boer como chefe do secretariado da ONU a partir de 1º de julho. A diplomata costarriquenha será responsável pelos compromissos firmados após 2012, quando termina o Protocolo de Quioto.
A 16ª Conferência das Partes (COP 16) será realizada em Cancun, no México, em novembro de 2010. Com o fracasso de Copenhague, a expectativa para a COP 16 é baixa. Espera-se, pelo menos, avançar em alguns pontos do "Mapa do Caminho de Bali", durante os dez dias de negociação.
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