Sul e Sudeste têm melhores resultados com crédito rural |
2014 . Ano 11 . Edição 81 - 05/10/2014
Pesquisa do Ipea revela que é preciso atacar problemas primários das demais regiões para aumentar e gerar impactos positivos do Pronaf Luiz De França O crédito a juros baixos para fomentar a agricultura familiar vem dando resultados significativos no PIB per capita e agropecuário das regiões Sul, Sudeste e Nordeste do país. No entanto, o impacto chega a ser limitado ou nulo no Norte e Centro-Oeste. Essa é a conclusão do estudo inédito Avaliação dos Impactos Regionais do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), realizado pelo Ipea, que engloba os anos de 2000 a 2010. “No Norte, e em boa medida também no Nordeste, o desenvolvimento das atividades agropecuárias é impactado negativamente por vários fatores, entre eles questões ambientais (principalmente no Norte), deficiência logística, atraso tecnológico, falta de crédito, carência de assistência técnica e questões climáticas (principalmente no Nordeste)”, explica um dos autores e coordenador da pesquisa, Guilherme Rezende. “A solução seria atacar esses problemas tentando minimizar seus efeitos negativos sobre a produção.” Na região Sul, cuja infraestrutura é tão boa quanto à do Sudeste, ainda existe um atenuante: o consolidado e atuante sistema de cooperativas agrícolas, às quais a maior parte dos agricultores familiares é filiada. As cooperativas vendem insumos para os produtores, oferecem assistência técnica e muitas vezes elas são o destino final da produção agrícola local, facilitando a comercialização. “O maior suporte produtivo recebido pelos agricultores familiares sulistas contribui para um impacto do Pronaf no Sul maior que o verificado nas regiões Norte, Nordeste e até mesmo no Sudeste no que se refere ao PIB agropecuário”, sintetiza Rezende. João Viana/Ipea De 2000 a 2010, aproximadamente 45% dos R$ 83,6 bilhões de recursos do Pronaf foram contratados por agricultores familiares do Sul, apesar de quase 50% dos agricultores familiares no Brasil estarem localizados nos estados da região Nordeste, de acordo com o IBGE (2009). “Em virtude desta concentração dos recursos na região, era de se esperar que um dos maiores resultados do programa ocorresse nela, seja sobre a taxa de crescimento anual média do PIB per capita, seja sobre a taxa de crescimento anual média do PIB agropecuário”, afirma Rezende. A menor participação relativa do Centro-Oeste na agricultura familiar sobre o PIB agropecuário regional é uma das explicações para esta ter sido a única região que sofreu uma retração de 2,7 pontos percentuais (de 7,3% para 4,6%) nas taxas anuais de crescimento do PIB total entre as décadas de 1990 e 2000. A colonização agrícola da região, iniciada na década de 1960, priorizou um padrão de ocupação agropecuário caracteristicamente voltado para a produção agrícola e pecuária de grande escala, o que resultou em uma concentração de terra mais evidente no Centro-Oeste que no restante do país. DADOS O tempo considerado necessário para medir os reais impactos de um programa de âmbito nacional como o Pronaf é de dois anos. Por esse motivo, os dados foram analisados a cada dois anos, nos períodos 2000-2002, 2002-2004, 2004-2006, 2006-2008 e 2008-2010. A escolha para esse intervalo de tempo está na busca de captar os impactos sobre as taxas de crescimento do Produto Interno Bruto per capita e do PIB agropecuário municipal. Existe uma defasagem de três anos para a construção de dados de PIB municipal por parte do IBGE. “Em 2013, quando iniciamos o estudo, o último dado disponível de PIB municipal era para o ano de 2010. Portanto, foi o período mais recente que pudemos avaliar”, diz Rezende. Em 2006, existiam quase 4,5 milhões de estabelecimentos agropecuários de caráter familiar, correspondendo a aproximadamente 84% do total de unidades agropecuárias. Com 20% das terras e respondendo por cerca de 38% da produção nacional, a agricultura familiar chega a ser responsável por 60% da produção de alguns dos produtos básicos da dieta do brasileiro, como feijão, arroz, milho, hortaliças, mandioca e pequenos animais. Rômulo Serpa/MDA De acordo com os pesquisadores, não há como saber quantas pessoas estão com contratos ativos, pois a contagem informada pelo Banco Central e repassada pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) contabiliza o número de contratos emitidos no ano. Como cada agricultor pode ter contratado mais de uma operação, o número de agricultores com contrato é menor que o número de operações. Contudo, o número de operações emitidas no ano safra de 2013/2014 foi de 1,9 milhão. O acumulado de julho-novembro nesta safra 2014/2015 já está em 976,6 mil operações de crédito. O agricultor e pecuarista Zair Alcindo Ferrari, 44 anos, da cidade de Carlos Barbosa, a 86 km de Porto Alegre (RS), é um dos beneficiários do programa. Há dez anos recorre às linhas de crédito do Pronaf, todos os anos. “Eu termino de pagar um e já pego outro, que é para continuar investindo na produção”, diz o agricultor. Os benefícios proporcionaram a Ferrari a aquisição de duas camionetes e da infraestrutura local para a produção de 100 kg de queijos por dia e de 500 kg de salames por semana. “Minha produção aumentou 200% desde que comecei a ter acesso ao crédito. Minha vida e a dos meus três funcionários também melhoraram”, conta. Pagando 2% de juros ao ano, sua única reclamação é que tem bancos que condicionam a liberação do crédito à aquisição de outros produtos da instituição. “Daí a gente acaba pagando um pouco mais.” As mulheres também são clientes do programa. Segundo Ernesto Galindo, técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea e coautor do estudo, 27% dos contratos são feitos em nome delas, apesar de, em termos de volume de crédito, corresponderem a apenas 15%. “É importante ressaltar que o crédito vai para a Unidade Familiar de Produção Rural, ainda que o contrato de crédito para o banco esteja vinculado a um CPF”, diz Galindo. Até por isso existe certa impressão quanto ao número de agricultores beneficiados. “Pode-se supor, sem precisão, que os contratos devem atingir de 25% a 35% dos agricultores familiares, o que daria entre 4,5 a 6,5 milhões de pessoas membros dessas famílias”, diz o técnico. Indiretamente, além da economia local, a produção desses agricultores pode corresponder a uma parcela considerável da produção agropecuária nacional. |