Excesso de burocracia dificulta a gestão de recursos hídricos em bacias transfronteiriças Amazônicas

O estudo apresentado no Ipea, identificou baixa implementação do Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos, ausência Comitê de Bacia Hidrográfica e de um Plano de Bacia

Os desafios enfrentados na gestão dos recursos hídricos na região transfronteiriça Amazônica são exacerbados pelo funcionamento de distintas institucionalidades nos três países que compõem a bacia do rio Acre: Brasil, Bolívia e Peru. Esta conclusão é destacada no estudo "Desafios e Propostas Para o Aperfeiçoamento da Gestão de Recursos Hídricos em Bacias Transfronteiriças Amazônicas – Estudo de Caso da Bacia do Rio Acre", debatido por especialistas da área e técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O estudo, conduzido por Rodrigo de Freitas Espinoza, pesquisador de pós-doutorado no Grupo de Política Públicas da Escola Superior de Agricultura da Universidade de São Paulo (ESALQ/USP), e Júlio César Roma, técnico de planejamento e pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do Ipea, foi apresentado durante um seminário realizado na última terça-feira (14).

“A bacia do rio Acre guarda especificidades e particularidades de governança: é trinacional, e no Brasil envolve os estados do Amazonas e Acre, passa por uma capital, que é Rio Branco, por Terras Indígenas e pela Reserva Extrativistas Chico Mendes. É uma bacia que nasce em território do país vizinho, o Peru e desemboca em terras nacionais no estado do Acre, chega ao Amazonas e tem uma importância histórica muito grande”, apresentou Rodrigo Espinoza. “É uma bacia relevante para o país, mas entendemos que um modelo de gestão que atenda às diversas e específicas demandas da população por ela beneficiada tende a apresentar muitas complexidades ainda não resolvidas”, completou.

Para detalhar a complexidade relatada, o pesquisador explicou que as institucionalidades distintas e o modelo de governança dos três países são conduzidas de natureza formal, cerimoniosa e protocolar da diplomacia em assuntos internacionais e por isso, refletem um excesso de burocracia. “Para esse desafio, a pesquisa sugere implementar Acordo de Cooperação entre os três países para a gestão integrada da bacia do rio Acre, tomando por base os exemplos da bacia do rio Apa (Brasil e Uruguai) e do rio Quaraí-Quareim (Brasil e Uruguai)”, disse Espinoza.

A bacia do rio Acre passa, entre outros municípios, pela capital, Rio Branco, que é urbanizada e registra problemas com relação a água, descarga de dejetos e outras problemáticas urbanas, além de variações singulares no nível do rio. “Há um agravamento desse cenário e particularidades da própria bacia do rio: a calha é muito estreita, então o volume do rio se altera muito na época de chuvas e seca. Para se ter ideia, o nível do rio varia de 1.700 metros cúbicos na época de cheia para 80 metros cúbicos na época de seca. É uma alteração de precipitação muito grande para região, o que acaba trazendo um desafio para a forma de ocupação do Território”, detalhou o Espinoza.

Demetrios Christofidis, debatedor do evento e pós-doutor em Águas, Saúde e Ambiente pela Fiocruz, sugeriu que os resultados da pesquisa fossem apresentados em órgãos relacionados aos Recursos Hídricos e ao Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), dada sua natureza plurinacional. “Nem todos conhecem a complexidade que é atuar com gestão dos recursos, por isso é importante que as instituições sejam envolvidas, para que vocês possam oferecer soluções que elas normalmente não têm ideia. Atuar com água é difícil por ser transdisciplinar e a região estudada envolve línguas, culturas, leis e níveis de organização diferentes”, ressaltou.

Aristides Monteiro Neto, diretor de Estudos e Políticas Regionais Urbanas e Ambientais do Ipea, ressaltou a importância da continuidade da pesquisa, sugerindo a expansão para outros países por onde a bacia do rio Acre passa. “É importante compreender a existência de uma legislação internacional ou nacional do outro lado. Uma nova pesquisa pode partir do ponto onde vocês não foram ou aonde pararam. Eventualmente essas conclusões podem ser utilizadas para trabalhos posteriores, seria o caso de entender a fragilidade do arranjo institucional do outro lado da fronteira também”, recomendou.

Entre os pontos positivos identificados pela pesquisa está a alta capacidade de mobilização da sociedade civil na região, que tem contribuído para a inclusão da bacia do rio Acre na Política Nacional de Recursos Hídricos. No entanto, o desafio continua sendo a compreensão dessas demandas e sua integração efetiva nos sistemas de gestão.

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