Complexidades e desafios de uma transição global para um comércio mais sustentável são debatidos em evento internacional
Especialistas do Ipea e do Overseas Development Institute debateram formas de tornar a produção, o comércio e o desenvolvimento industrial mais sustentáveis, com foco nas perspectivas africanas
Publicado em 20/09/2024 - Última modificação em 20/09/2024 às 17h52

Pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada participaram, nesta terça-feira (17), do webinar ‘Transformando a dinâmica e promovendo uma transição comercial e industrial verde e justa’ (Changing the dynamics and advancing a just green trade and industrial transition). O evento foi realizado a partir da parceria entre o Ipea e o Overseas Development Institute (ODI), think tank do Reino Unido e membro do Conselho Consultivo Internacional do T20. Especialistas buscaram explorar as perspectivas dentro do G20, com foco específico nos interesses africanos, enquanto buscaram alternativas para reconfigurar as dinâmicas atuais e avançar em uma agenda de comércio verde mais equitativa.
A embaixadora Amina Mohamed, presidente do Fórum de Negociações Comerciais e Investimentos (TNIF), acredita que todos enfrentarão muitos desafios quando se trata de transição verde e fragmentação da política global, mas está convencida de que, se trabalharmos juntos de boa-fé e na mesma direção, seremos capazes de enfrentar os desafios que estão surgindo com a transição que já começou e que, obviamente, está avançando mais rapidamente em algumas regiões do que em outras. “Devemos enfrentar esses desafios juntos, e também observar as medidas unilaterais que estão sendo implementadas. Ao enfrentarmos esses desafios, acredito que devemos fazê-lo de uma maneira que permita a todos nós aproveitar as novas oportunidades que se apresentam”, completa.
Já o professor Faizel Ismail, diretor da Escola Nelson Mandela de Governança Pública da Universidade da Cidade do Cabo, exalta que o próximo G20 oferecerá à África do Sul uma grande oportunidade para focar nas questões de extrema importância para o continente: “O próximo G20 será em solo africano e será um G20 africano, portanto, ele deve se concentrar na crise, talvez a maior crise que a humanidade enfrenta atualmente, que é a crise climática”.
Fábio Veras, da Diretoria de Estudos Internacionais do Ipea, reforçou a todos que o G20 não possui um secretariado e que cada presidência é responsável por definir as suas prioridades de acordo com a presidência anterior e a futura. Para ele, os grupos de engajamento, em particular o T20, têm o papel de manter a memória dos líderes do G20 e mostrar para eles o que foi prometido e o que foi entregue. O diretor lembrou também que o comércio é visto como o motor de crescimento, sendo muito importante para a redução da pobreza.
“Uma outra prioridade que encontramos na Índia e que pode ser reaproveitada na África do Sul e que não foi tão priorizada na presidência brasileira é reconhecer os desafios de micro, pequenas e médias empresas para se engajarem no comércio internacional” explicou, citando o chamado do T20 da Índia para a ação de Jaipur, com o intuito de melhorar o acesso das micro, pequenas e médias empresas à informação e promover sua integração ao comércio internacional. Veras também citou a adoção do Quadro Genérico do G20 para Mapeamento de Cadeias de Valor Globais (GVC) para ajudar os membros a identificar riscos e construir resiliência.
O diretor destacou que no documento final da reunião ministerial de comércio e investimento do G20 Índia, os países do G20 reconheceram o papel essencial da cooperação multilateral para enfrentar de maneira eficaz os desafios comuns relacionados ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável e se comprometeram a se engajar em discussões adicionais sobre comércio e sustentabilidade. Deste modo não surpreende que uma das quatro prioridades do Grupo de Trabalho sobre Comércio e Investimento da presidência brasileira do G20 seja exatamente Comércio e Desenvolvimento Sustentável e que a principal entrega do grupo seja um conjunto de princípios-chave acordados e que sirvam como diretrizes para a formulação e implementação de políticas nacionais que impactam o comércio. Na reunião de ministerial a ser realizada em 24 e 25 de outubro saberemos o quão abrangentes serão estes princípios.
Fernando Ribeiro, pesquisador e coordenador de estudos de comércio internacional do Ipea, citou as discussões sobre o processo do T20 Brasil e as interações produtivas com o G20 e de como as questões de desenvolvimento sustentável, transições justas e sua relação com as regras comerciais e a governança global como um todo estão no centro das atenções.
Segundo ele, os principais desafios atualmente dos países em desenvolvimento em relação ao enfrentamento das mudanças climáticas, promoção de uma transição verde justa e reconciliação do comércio com o desenvolvimento sustentável – ou, ainda, o uso do comércio como uma ferramenta para promover práticas produtivas mais sustentáveis – podem ser separados em três questões principais.
A primeira é que conflitos comerciais e unilateralismo estão causando o desmantelamento dos sistemas de comércio e investimento baseados em regras, com a Organização Mundial do Comércio (OMC) em seu núcleo. Isso prejudica principalmente os países menos desenvolvidos. A segunda questão é que os países em desenvolvimento frequentemente carecem de recursos adequados – financeiros, humanos, institucionais, tecnológicos – para projetar e implementar planos de transição sustentável a longo prazo. Por fim, a transição global em direção a um sistema mais multipolar está gerando uma série de tensões políticas, econômicas e sociais sobrepostas e em cascata. Combinada com a mudança climática e a transformação digital, a transição está contribuindo para o aumento da volatilidade e incerteza geopolítica.
Para o pesquisador, as recomendações para o G20 enfatizam o fortalecimento da OMC como o principal fórum para negociações multilaterais e a aplicação de regras, incluindo questões ambientais, garantindo a resolução de disputas e práticas comerciais justas. Elas pedem cooperação em comércio, meio ambiente e política climática, evitando a exportação de padrões regulatórios ou sanções. No comércio agrícola, é necessário equilibrar a expansão da produção com medidas contra a mudança climática, assegurando a segurança alimentar e protegendo o comércio de tensões geopolíticas. Além disso, propõem a reforma do Acordo sobre Subsídios da OMC para evitar distorções comerciais e criticam a proliferação de regulamentos ambientais que criam barreiras comerciais e favorecem práticas neo-protecionistas.
Fernando também sugere o desenvolvimento de instrumentos para apoiar os países menos desenvolvidos na construção de capacidade institucional para criar e implementar planos de transição liderados nacionalmente. Elas também destacam a importância de aumentar a cooperação Sul-Sul e Norte-Sul para facilitar a transferência de tecnologias existentes e o desenvolvimento de novas tecnologias de baixo custo, promovendo a industrialização verde em países em desenvolvimento de baixa renda e dependentes de commodities. Por fim, propõem a criação de mecanismos de financiamento baseados em subsídios e créditos concessionais, com critérios de alocação que priorizem países vulneráveis, de baixa renda, grupos desfavorecidos e pequenas empresas.
Dentre as prioridades do G20 Brasil estão o comércio e desenvolvimento sustentável, a maior presença de mulheres no comércio internacional, a inclusão do desenvolvimento sustentável em acordos de investimento e a reforma da OMC e o fortalecimento do sistema comercial multilateral. A presidência brasileira propõe que os membros do G20 trabalhem em direção a um entendimento comum sobre princípios-chave a respeito do comércio e do desenvolvimento sustentável, que sirvam como diretrizes para a elaboração e implementação de políticas nacionais com impacto no comércio internacional.
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