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Ipea reforça compromisso com a luta por direitos dos povos de matrizes africanas
Seminário do Instituto abordou os desafios ligados ao racismo religioso e a importância da preservação da memória afro-brasileira
Publicado em 21/03/2025 - Última modificação em 21/03/2025 às 17h26

Foto: Helio Montferre/Ipea
“Ouço vozes, ouço vozes vindo da África!” Com essa declaração, a atriz Mirian Martins abriu o seminário “Povos de matrizes africanas na luta por Direitos”, nesta quinta-feira, 20, no auditório do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O evento integra calendário de ações do coletivo Presença Negra – uma mobilização dos servidores do Ipea e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para promover reflexões e trazer vozes externas que retratem a luta e os desafios da igualdade racial no Brasil.
O seminário celebrou o Dia Nacional das Tradições de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, 21 de março, que reconhece a importância histórica das religiões afro-brasileiras. A data, sancionada em 2023, coincide com o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, estabelecido pela Organização das Nações Unidades (ONU), em 1966, em memória às vítimas do massacre em Sharpeville, na África do Sul, durante o Apartheid.
Segundo o integrante do grupo Presença Negra, Antonio Teixeira Lima Junior, o evento é apenas um dos passos planejados para promover o tema. “Queremos que essa discussão seja recorrente, contínua, e que seja incorporada de forma transversal nas pesquisas e ações da instituição”, destacou.
A presidenta do Ipea, Luciana Mendes Santos Servo, destacou as ações do Presença Negra para ampliar a visibilidade sobre a causa racial e seus representantes, que nem sempre têm o devido reconhecimento. “Parabenizo pela continuidade, parabenizo pela potência. E agradeço, mais uma vez, a parceria com o Iphan. O coletivo tem como premissa a partilha da palavra entre indivíduos e grupos que permanecem fora dos livros oficiais.”
O diretor de Patrimônio Imaterial do Iphan, Deyvesson Gusmão, analisou a relação entre os povos de matrizes africanas e o patrimônio cultural. “Destaco três perspectivas: o próprio patrimônio cultural, em específico, e seu valor aos povos de matriz africana; a sua importância como instrumento de reparação histórica; e o seu papel para a garantia de direitos”, destacou. Ele ressaltou a longa trajetória de apagamento das expressões culturais afro-brasileiras, que foram marginalizadas e desvalorizadas, assim como as práticas religiosas e os espaços sagrados.
Ancestralidade e preservação da memória cultural
Diretora de Políticas para Povos e Comunidades de Matriz Africana e de Terreiros do Ministério da Igualdade Racial, Luzi Borges apresentou as políticas públicas recém aprovadas para a valorização dos povos e comunidades tradicionais. “Finalmente, temos o ineditismo deste escopo na Esplanada. A partir de 2024, temos, pela primeira vez, uma política nacional para povos e comunidades de terreiros de matriz africana, que reflete o desenvolvimento socioeconômico cultural, material e imaterial da sua existência”, afirmou.
Borges falou ainda sobre o planejamento anual aprovado, que contempla campanhas nacionais de fomento à agroecologia, cultura e economia solidária. E reforçou a importância da consolidação de dados estruturados para atender de forma satisfatória as necessidades dessas comunidades. “Atualmente nós temos dados desagregados, porque ainda não há um filtro obrigatório que retrata os povos de terreiro e não há padronização das informações de estados e municípios.”
Representando a Fundação Palmares, Iracilda Santos falou sobre as ações da instituição para o reconhecimento da influência negra na cultura e formação social do Brasil. “Nós atendemos quilombolas e povos de terreiro, fortalecendo a cultura afro-brasileira. Ano passado, divulgamos o edital Cozinha de Terreiro e já estamos elaborando um prêmio que valoriza a arte ancestral e a arte sagrada”.
Cultura de matriz africana e a luta social
Os terreiros são espaços reconhecidos de luta social. O professor do departamento de Filosofia da Universidade de Brasília Wanderson Flor elencou como os movimentos por direitos feminista, lgbtqiapn+ e de pessoas com deficiência tiveram raízes no movimento negro e em seus espaços de cultura. “Os terreiros, junto com os quilombos, foram historicamente espaços comunitários, que chamaram a atenção para que a luta por direitos não fosse de ordem apenas formal e que alcançassem a todas as pessoas.”
No encerramento do seminário, a mãe baiana de Oyá, Yalorixá do Ilé Axé Oyá Bagan, falou sobre a necessidade de políticas públicas que combatam o racismo estrutural e deem equidade de tratamento e respeito aos espaços de culto. Segundo ela, um dos aspectos que reforçam o racismo é a regularização de terreiros, assim como as agressões que esses espaços sofrem devido à intolerância religiosa.
A yalorixá apontou as diferenças no tratamento para a regularização entre os terreiros e templos de outras denominações. “Durante os anos 2000, tivemos alguns terreiros destruídos, sem que houvesse tempo para defesa ou, até mesmo, para retirar e preservar objetos sacros. Já tivemos comunicação no final da tarde de um dia e a chegada do trator na manhã seguinte para derrubada do espaço, diferente de outros centros religiosos.”
O coletivo Presença Negra prevê a realização de outros eventos ao longo do ano: em maio, um debate sobre os aspectos do trabalho; em junho, sobre os movimentos lgbtqiapn+ e; em novembro, em celebração do Dia da Consciência Negra.
O seminário pode ser assistido na íntegra no canal do Ipea do Youtube.
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